“Uma cruz santificada é melhor do que um conforto não santificado. A perda na misericórdia é melhor do que o deleite na ira. " (Samuel Bolton).
O ministério pastoral precisa ser encarado na dimensão do sofrimento. Afinal de contas, bebemos o cálice do Senhor e fomos batizados com o mesmo batismo que ele o foi, segundo texto de Marcos 10. Na realidade, sofremos por cumprimento expresso da vontade de Deus em nossas vidas, uma vez que não consigo mensurar um ministério que não tenha uma reserva de renúncia e sofrimento.
É inadmissível encararmos o conceito de um ministério (não apenas pastoral, mas toda e qualquer expressão de serviço no Reino de Deus) que não esteja antenado com aquilo que eu chamo de “escravidão sob as consciências alheias”. No texto clássico sobre esse assunto, o apóstolo Paulo escrevendo à complicada igreja de Corinto fez questão de informar-lhes que o ministério que ele desenvolveu entre eles foi como de alguém que está imbuído de uma “mordomia” (do grego oikonomos).
I Coríntios 9:16-17
16 - Porque, se anuncio o evangelho, não tenho de que me gloriar, pois me é imposta essa obrigação; e ai de mim, se não anunciar o evangelho!
17 - E por isso, se o faço de boa mente, terei prêmio; mas, se de má vontade, apenas uma dispensação me é confiada.
Cabe aqui uma citação a guisa de comentário desses versos do reformador João Calvino: “O homem, uma vez chamado, deve pôr indelevelmente em sua cabeça que ele não é mais livre para retroceder, quando bem lhe convir, se porventura as frustrações arrebentarem seu coração, ou as tribulações o esmagarem; porquanto ele está dedicado ao Senhor e à Igreja, e se acha firmemente amarrado por um laço sagrado, o qual lhe seria pecaminoso desamarrar.”.
O ministério precisa dos melhores homens, já disse Spurgeon aos seus alunos, e esse é um fato incontestável! Não dá para conviver no ministério com gente fraca, ensimesmada e refém das novidades mercadológicas, sobretudo em contextos de “movimentos de crescimento de igrejas” onde a regra é fazer de tudo para agradar aos homens, e não a Deus. Para estes, o apóstolo Paulo mais uma vez deve ser citado:
Gálatas 1:10
10 - Porque, persuado eu agora a homens ou a Deus? ou procuro agradar a homens? Se estivesse ainda agradando aos homens, não seria servo de Cristo.
Eu sonho com o tempo em que nossas denominações serão livres de obreiros interessados apenas em si mesmos, que ainda não passaram pelo teste do tempo maduro, e que, pelo contrário estão sempre em busca da supremacia do poder pela “meritocracia” e não pelos favores oriundos da Graça de Deus. Quem não passou ainda pela morte do seu eu na cruz não pode transitar pelos limites altos do sobrenatural, fica “patinando” aqui em baixo com um ministério puramente firmado em suas opiniões pessoais.
Em outras palavras, a minha tese a ser exposta é que, se o ministério pastoral ou eclesiástico no sentido mais abrangente da palavra não reunir homens e mulheres que não queiram “viver de brisa”, mas sim que se submetem a passar pela moenda do sofrimento, sem ignorar a verdade de que, mais cedo ou mais terá de encarar muitas “noites sombrias da alma”, onde na maioria das vezes estarão sozinhos, mas nunca desamparados, pois o Senhor não abandona os seus soldados feridos, e como diz uma música, ele não os deixa morrer!
PS. Esse artigo é uma homenagem aos verdadeiros pastores que eu conheci, sendo que os que mais me encantaram com o testemunho aguerrido foram os haitianos. O Haiti, embora seja o país mais miserável das Américas é o lugar onde eu vi o meu ministério pastoral sendo submetido a uma dura prova. Pois vi homens ali que não possuem formação alguma, não brigam por querelas teológicas, mas adotam dezenas de crianças abandonadas, e alguns mantém seus cultos em campos abertos, onde a palavra de Deus é pregada sem triunfalismos próprios da miserável “teologia da prosperidade”, mas sim pela emergência da cruz. Eu ouvi alguns dos pastores lá conversando, e a despeito do abismo linguístico eu percebi em seus semblantes, os mesmos semblantes de Daniel, Hananias, Mizael e Azarias, que tiveram seus “rostos melhores” por conta da decisão que colocaram no coração de não se contaminar com as iguarias reais. Tenho para mim, com tristeza que muitos dos pastores brasileiros já se venderam ao sistema, a ponto de o desejo de estarem diante dos Nabocodonozores de nosso tempo é maior do que está diante do Rei dos Reis, aquele que morreu para viver e perdeu para ganhar! Abaixo a sofisticação pastoral e que, o Senhor tenha misericórdia dos pastores convertidos em nosso país para que mantenham a “pureza e a simplicidade” que se encontra no Senhor Jesus.
Tenho dito e choro quando digo o digo.
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